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Ninguém é obrigado a permanecer em um relacionamento falido

Ninguém é obrigado a permanecer em um relacionamento falido

Vez ou outra escuto alguém dizer que o amor é como um cristal, depois de quebrado, não se pode colar os cacos, pois ali não existe mais a possibilidade de ser restaurado, de tornar-se o que foi um dia.

No entanto, nada nesta vida pode ser igual ao que foi numa época, tampouco ninguém é obrigado a ser o mesmo a vida inteira ou permanecer numa relação falida, onde não existe respeito, companheirismo e amor.

Melhor é ser sincero consigo, caminhar por novas rotas e abandonar os campos inférteis.

Também não pretendo em nenhum momento ser reducionista ou classificar relacionamentos, pois estes são muito dinâmicos, complexos e únicos, mas sim fazer uma metáfora, um paralelo, uma comparação da descartabilidade e da durabilidade dos relacionamentos com o vaso de vidro e o vaso chinês.

Existe uma técnica chinesa muito antiga chamada Kintsugi ou Kintsukuroi e que consiste em reparar jarros de cerâmica com ouro. O jarro trincado, rachado ou quebrado que foi reconstituído transforma-se em uma obra de arte única, resistente e de alto valor existencial, exatamente por ter sido quebrado e reestruturado.

Esta técnica é um exemplo de que em nossa vida prática, o que foi reestruturado com cuidado torna-se mais resiliente, mais forte e maduro para lidar com as vicissitudes da vida.

Tantas vezes a descartabilidade é o caminho mais fácil, mas em alguns casos não é o mais acertado e isto vale também para os relacionamentos.

Relacionamentos podem trincar devido a sua complexidade, visto que relacionar-se não é um processo fácil. Somente quem se relacionou intimamente com outra pessoa sabe que a conjugalidade afetiva traz constantes desafios diários.

Porém, há casos e casos. De fato, algumas posturas e comportamentos não podem ser aceitos jamais.

Nunca poderemos suportar ou fazer vista grossa em um relacionamento onde as agressões físicas e psicológicas ditam as regras.

Quando o desrespeito e a falta de interesse imperam, quando o amor e o cuidado de fato acabam, quando já foi feito tudo o possível, o momento é de partir para uma nova história.

Permanecer em um relacionamento abusivo, descompensado ou em uma situação onde o vinculo afetivo não faz mais morada, é se autoenganar e enganar o outro também, pois a pior solidão é a que se vivencia a dois.

Há casos de relacionamentos que sao fim de linha mesmo e não tem nada a ver com descartabilidade, pois já foi tentado todos os reparos possíveis. E não adianta se martirizar, querer remendar, colar os cacos, se culpar ou se vitimizar.

Em alguns casos, querer permanecer no trem da viagem da situação que não existe mais, não é a melhor solução pois o caminho só tem retorno, embora não exista mais volta.

Hà situações desgastadas e soterradas que estão bem debaixo do nosso nariz, esperando de nós somente uma postura de aceitação e desapego. Lembrando que os outros não são de nossa posse, de nossa propriedade e que no final das contas, quer queiramos ou não, cada um resolve o caminho que deseja seguir.

Em contrapartida, há casos em que o relacionamento é deixado nas primeiras dificuldades, na primeira crise, nas diferenças, contratempos e incompatibilidades sem que sejam contornadas, sem que o vínculo (se ainda existir) seja discutido, elaborado, tentado, onde o relacionamento é descartado sem nenhum investimento em repará-lo para que o mesmo possa crescer estruturalmente em bases fortes, para então ultrapassamos a percepção idealizada do outro e forjando a construção de um relacionamento “real”. ù

Digo isto, porque na fase inicial de um relacionamento geralmente o que nos atrai no outro é o desconhecido, o misterioso, o que se tem a descobrir, o que se anseia por viver num estado de quase êxtase, onde o parceiro é percebido sem algum defeito ou qualquer outra coisa que possa “colocar por terra” este momento mágico. Mas como tudo na vida é transitório, até mesmo a fase da paixão declina.

Contudo, quando houve investimento na construção de um vínculo com bases sólidas, o que nos liga ao outro é a permuta de sentimentos enraizados daquilo que de melhor se pode oferecer nesta relação.

Sabemos que a vida possui um dinamismo próprio que viabiliza constantes transformações que não podemos reter no tempo ou em nossas expectativas. Os relacionamentos passam por atualizações em que precisamos acompanhar o passo, ajustar, investir, renovar e reinventar para que se adequem às exigências daquele momento especifico.

Novas mudanças passam a compor este cenário, ocorrem ajustes no dia a dia, o tempo precisa ser democratizado com outras atividades, retirando-nos as lentes cor de rosa, onde a realidade se desnuda e a interação não é mais a idealização do outro, mas uma aproximação autêntica de tudo aquilo que é vivenciado na prática numa convivência com seus defeitos e virtudes, com as alegrias e desafios que toda relação humana comporta. No entanto, tudo nesta vida depende de como foi investido, cuidado e enraizado.

Diante de algumas dificuldades, muitos relacionamentos se rompem, não se colam mais; outros, embora não permaneçam intactos tornam-se ligados, fortalecidos, reinventados e renovados.

Como tem sido a construção do seu relacionamento? Como você tem investido? Como um vaso de vidro ou um vaso chinês?

*DA REDAÇÃO SAG. Foto de Elia Pellegrini no Unsplash.

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Soraya Rodrigues

https://www.facebook.com/FechamentodeCicloeRenascimento/?fref=ts Soraya Rodrigues de Aragão é psicóloga, psicotraumatologista, escritora e palestrante. Realizou seus estudos acadêmicos na Unifor e Universidade de Roma. Equivalência do curso de Psicologia na Itália resultando em Mestrado. Especializou-se em Psicotraumatologia pela A.R.P. de Milão.

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