O tempo passa e quando percebemos, estamos correndo contra o tempo, passamos a ser pais de nossas mães, e a relação se inverte.

Nem sempre estamos preparados para cuidar daqueles que cuidaram de nós. Principalmente, se a relação que temos com eles não é de amor, e sim, o cuidado se faz por pura e restrita obrigação.

Honrar pai e mãe é o princípio básico para que todas as áreas da nossa vida fluam com gratidão. Se não conseguimos honrá-los, nossa vida trava, e não adianta trabalhar de sola a sol, não adianta se dedicar ao máximo, uma tristeza sempre nos acompanhará.

Estava pensando sobre isso, quando me deparei com um texto de um autor português consagrado, Valter Hugo Mãe, cujo trabalho, admiro muito. E como não acredito em coincidências, senti que deveria postar o texto dele na íntegra aqui pra vocês, para começar essa conversa a respeito dessa inversão de papeis que vem fazendo muitas pessoas sofrerem.

Filhos querem o pai e a mãe de volta, mães e pais gostariam que a sua independência fosse devolvida pela vida, e nenhum dos desejos vão se realizar, nesse caso.

A ideia aqui é aceitar a natureza do tempo, e entender que, na verdade, a gente nunca se torna pais dos nossos pais, porque quando assumimos essa posição, e acreditamos que temos que ser os pais deles só porque eles não conseguem realizar as atividades que antes conseguiam, nós os fazemos sofrer e nos machucamos muito.

Não há necessidade de inversão de papeis, precisamos aprender a cuidar deles na nossa posição de filhos, e como um filho deve tratar seus pais? Com amor e respeito. Mesmo que eles passem a agir como crianças, eles ainda serão nossos pais, e quando passamos a cuidar deles como filhos e não como pais, os corações se encaixam.

Se assim fizermos, e aprendermos a cuidar dos nossos pais como filhos e não tentando assumir a posição que não nos cabe, com respeito e amor, essa fase inevitável da nossa vida será curtida com mais leveza e nos sentiremos felizes em servi-los e não estressados.

Esse é o meu sentimento sobre essa fase da vida onde nossos pais envelheceram e precisam dos nossos cuidados.

Agora, deixarei você com o texto do autor Valter Hugo Mãe, sobre o cuidado que ele tem com a sua mãe. Você precisa cuidar dos seus pais? Veja se você se identifica:

“A minha mãe é a minha filha. Preciso de lhe dizer que chega de bolo de chocolate, chega de café ou de andar à pressa. Vai engordar, vai ficar eléctrica, vai começar a doer-lhe a perna esquerda.

Cuido dos seus mimos. Gosto de lhe oferecer uma carteira nova e presto muita atenção aos lenços bonitos que ela deita ao pescoço e lhe dão um ar floral, vivo, uma espécie de elemento líquido que lhe refresca a idade. Escolho apenas cores claras, vivas.

Zango-me com as moças das lojas que discursam acerca do adequado para a idade. Recuso essas convenções que enlutam os mais velhos. A minha mãe, que é a minha filha, fica bem de branco, vermelho, gosto de a ver de amarelo-torrado, um azul de céu ou verde.

Algumas lojas conhecem-me. Mostram-me as novidades. Encontro pessoas que sentem uma alegria bonita em me ajudar. Aniversários ou Natal, a Primavera ou só um fim-de-semana fora, servem para que me lembre de trazer um presente. Pais e filhos são perfeitos para presentes. Eu daria todos os melhores presentes à minha mãe.

Rabujo igual aos que amam. Quando amamos, temos urgência em proteger, por isso somos mais do que sinaleiros, apontando, assobiando, mais do que árbitros, fiscalizando para que tudo seja certo, seguro. E rabujamos porque as pessoas amadas erram, têm caprichos, gostam de si com desconfiança, como creio que é normal gostarmos todos de nós mesmos.

Aos pais e aos filhos tendemos a amar incondicionalmente mas com medo.

Um amigo dizia que entendeu o pânico depois de nascer o seu primeiro filho. Temia pelo azedo do leite, pelas correntes de ar, pelo carreiro das formigas, temia muito que houvesse um órgão interno, discreto, que disfuncionasse e fizesse o seu filho apagar.

Quem ama pensa em todos os perigos e desconta o tempo com martelo pesado. Os que amam sem esta factura não amam ainda. Passeiam nos afectos. É outra coisa.

Ficar para tio parece obrigar-nos a uma inversão destes papéis a dada altura. Quase ouço as minhas irmãs dizerem: não casaste, agora tomas conta da mãe e mais destas coisas.

Se a luz está paga, a água, refilar porque está tudo caro, há uma porta que fecha mal, estiveram uns homens esquisitos à porta, a senhora da mercearia não deu o troco certo, o cão ladra mais do que devia, era preciso irmos à aldeia ver assuntos e as pessoas.

Quem não casa deixa de ter irmãos. Só tem patrões. Viramos uma central de atendimento ao público. Porque nos ligam para saber se está tudo bem, que é o mesmo que perguntar acerca da nossa competência e responsabilizar-nos mais ainda.

Como se o amor tivesse agentes. Cupidos que, ao invés de flechas, usam telefones. E, depois, espantam-se: ah, eu pensei que isso já tinha passado, pensei que estava arranjado, naquele dia achei que a doutora já anunciara a cura, eu até fiz uma sopa, no mês passado até fomos de carro ao Porto, jantámos em modo fino e tudo.

Quem ama pensa em todos os perigos e desconta o tempo com martelo pesado. Os que amam sem esta factura não amam ainda.

Quando passamos a ser pais das nossas mães, tornamo-nos exigentes e cansamo-nos por tudo. Ao contrário de quem é pai de filhas, nós corremos absolutamente contra o tempo, o corpo, os preconceitos, as cores adequadas para a idade. Somos centrais telefónicas aflitas.

Queremos sempre que chegue a Primavera, o Verão, que haja sol e aqueçam os dias, para descermos à marginal a ver as pessoas que também se arrastam por cães pequenos. Só gostamos de quem tem cães pequenos.

Odiamos bicharocos grotescos tratados como seres delicados. O nosso Crisóstomo, que é lingrinhas, corre sempre perigo com cães musculados que as pessoas insistem em garantir que não fazem mal a uma mosca. Deitam-nos as patas ao peito e atiram-nos ao chão, as filhas que são mães podem cair e partir os ossos da bacia. Porque temos bacias dentro do corpo. Somos todos estranhos.

Passeamos estranhos com os cães na marginal e o que nos aproveita mesmo é o sol. A minha mãe adora sol. Melhora de tudo. Com os seus lenços como coisas líquidas e cristalinas ao pescoço, ela fica lindíssima. E isso compensa. Recompensa.

Comemos o sol. Somos, sem grande segredo, seres que comem o sol. Por isso, entre as angústias, sorrimos.” Via Fronteiras do Pensamento

E você? O que vem enfrentando com os cuidados com os seus pais? Você sente que está correndo contra o tempo? Conte a sua historia nos comentários.

*DA REDAÇÃO SAG. *Foto de Lua Vazia no Unsplash.

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